sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

 
 
"O que as pessoas mais desejam é alguém que as escute de maneira calma e tranqüila.
Em silêncio. Sem dar conselhos. Sem que digam: “Se eu fosse você”.
A gente ama não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A fala só é bonita quando ela nasce de uma longa e silenciosa escuta. É na escuta que o amor começa.
E é na não-escuta que ele termina. Não aprendi isso nos livros.
Aprendi prestando atenção."





Rubem Alves

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

A Caminho

Entre as coisas que não quero ser na vida,
‘incompleta’ é uma delas.
[Camila Heloíse]
Eu não queria ser diferente. Mesmo que minha cabeça funcione como uma máquina de lavar, dando voltas sem fim, não queria ser outra pessoa, ser normal. Digo isso porque todo mundo me olha como se eu fosse de outra espécie, como se eu viesse de outro planeta. Todos os dias eu me visto como uma mulher normal e simples. Mas sei que ninguém me vê assim.
Embora todo mundo cobre o tempo inteiro respostas perfeitas da minha boca, vai uma dica que eu espero que não esqueçam: eu não tenho a menor idéia do que fazer! Mesmo que às vezes eu pareça sensata demais, coerente demais, racional demais, concreta demais. Eu sou apaixonada demais, inconseqüente demais, frustrada demais e bem menos esperta do que pareço.
Por isso que às vezes me assusto e vou embora dos lugares. Eu fujo dos amigos, dos amores, dos livros e dos meus textos. Porque ficar me cobra demais, me espero sempre mais, um pouco mais até me esticar tanto que quando os membros voltam pro lugar me arrebento. Já nem consigo lembrar de onde foi que parti.
Então eu vou embora, como se fosse pra sempre. Vou embora em silêncio e sem a menor vontade de ser seguida. Não levo chinelos, não levo recordações. Vou como se não me preocupasse com os serviços ‘pela metade’ que deixei pra trás. Parto como se não me importasse. Parto como se nem tivesse existido.
E é de longe que eu começo a brotar outra vez. É no vazio e na falta de palavras que me dou conselhos, que consigo ser coerente pela primeira vez em ter uma gota de paciência nesta minha mania de atropelar pessoas, coisas, paixões, amizades e transformar qualquer festa em um conflito terrível dentro da minha cabeça máquina-de-lavar.
Depois de preencher os vazios que eu mesma criei, volto devagar, com medo, volto assustada até que a vida me devolva por completo. Volto como agora, com os olhos implorando pra ninguém me exigir nada, porque eu estou chegando ao mundo agora e eu não sei me doar ainda, mas sei que vou aprender de novo, e eu prometo, como das outras milhões de vezes que fui embora e acabei voltando.

cuidado coração, cuida-do-coração


Certa vez eu pensei: Não tenho um coração, não mais.
Não falo da forma de não ter nada pulsante em mim. Mas daquela coisa que nos faz escolher o melhor caminho. Aquele coração estava ausente de mim. Estava tão perdida que só imaginava que pudesse ser isso, um vazio. Um buraco feito de um tiro certeiro que veio de qualquer direção que meus olhos desatentos não sabem a origem. Não sabia o que fazer e isso era tão grande que ocupava os espaços da memória, dos sonhos e dos outros sentimentos. Talvez tenha me esquecido até de como era sentir. Certas coisas da vida não necessitam de explicação, apenas um olhar atento e um coração aberto. Nos silêncios calmos e serenos é que o coração encontra o caminho certo e as respostas para nossas perguntas. Mas até para dar este conselho para si mesmo é difícil. É preciso mergulhar nos becos obscuros do próprio espírito, se afundar nas próprias angústias e arrancar com as próprias mãos o centro de todo horror próprio: O medo.
Medo de ter coragem e sucumbir. Medo de olhar para si mesmo uma única vez e se tornar egoísta demais. Medo de olhar sempre em frente e esquecer alguém lá atrás. Medo de se jogar e parecer louco. Medo de arriscar tudo e se tornar tolo demais.
E com toda a fé que ainda me sustentava, mergulhei como nunca dentro da própria existência, e arrancando estes medos, afastando das retinas as cortinas que me impediam de ver (e viver) o que era bom, me fiz silêncio. Só então pude começar a escutar o coração, e ver que ele sempre estave ali me apontando a direção.
Deixei as minhas dores em casa, levei nós dois pra passear. Sentei a sombra pra proteger teus olhos, levei água fresca para te saciar. Esvaziei os pensamentos e os sonhos para o futuro. Coloquei as mãos no peito, pra te fazer carinho. Cantei canções pra te acalmar. Agora vou dar um tempo nas nossas brigas, nas nossas disputas diárias de quem é que tem razão. Prometo, coração, agora vou te cuidar.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

"Dias melhores. Caminhos novos, eu tenho fé, eu acredito.
A lua ainda fala comigo."
"Tinha uma criação de duzentas e oitenta e cinco borboletas na barriga, mas uma a uma elas vão fugindo. e dói."
    O acaso sempre dava um jeito de pô-los novamente juntos. Assustadoramente iguais, procuravam-se quase que por reflexo. Uma mensagem aleatória, uma ligação espontânea, uma vontade qualquer eram o suficiente para colocá-los outra vez nos braços um do outro, sem prudência ou perspectiva.
    Ele não disfarçava suas intenções, ela não o desencorajava. Ele mordia o lábio, ela não escondia o arrepio. Ele investia, ela não se esquivava. Longe dos olhares de censura, seguiam sua natureza humana como uma espécie de afronta à rotina, às convenções, aos relacionamentos comuns. Queriam-se sem se pertencerem. Tinham-se sem se cobrarem. Amavam-se sem se amarem.
    Toda essa naturalidade, porém, tinha prazo de validade. Talvez ela se apaixonasse e fosse viver uma história de amor com um terceiro; talvez ele cansasse daquela incerteza; ou talvez eles simplesmente decidissem que passaram dos limites. O fato é que jamais saberiam previamente quando seria a última vez que se encontrariam, pois seus instintos estavam conectados, de modo que, quando a solidão apertasse, eles invariavelmente se buscariam sedentos de familiaridade.
    Enquanto o “talvez” não os afastava, contudo, iam alimentando o que tinham sem sequer mencionar o futuro. Somente pele, vontade e uma pitada de malícia.



- Paula Braga.
  
  O acaso sempre dava um jeito de pô-los novamente juntos. Assustadoramente iguais, procuravam-se quase que por reflexo. Uma mensagem aleatória, uma ligação espontânea, uma vontade qualquer eram o suficiente para colocá-los outra vez nos braços um do outro, sem prudência ou perspectiva.
    Ele não disfarçava suas intenções, ela não o desencorajava. Ele mordia o lábio, ela não escondia o arrepio. Ele investia, ela não se esquivava. Longe dos olhares de censura, seguiam sua natureza humana como uma espécie de afronta à rotina, às convenções, aos relacionamentos comuns. Queriam-se sem se pertencerem. Tinham-se sem se cobrarem. Amavam-se sem se amarem.
    Toda essa naturalidade, porém, tinha prazo de validade. Talvez ela se apaixonasse e fosse viver uma história de amor com um terceiro; talvez ele cansasse daquela incerteza; ou talvez eles simplesmente decidissem que passaram dos limites. O fato é que jamais saberiam previamente quando seria a última vez que se encontrariam, pois seus instintos estavam conectados, de modo que, quando a solidão apertasse, eles invariavelmente se buscariam sedentos de familiaridade.
    Enquanto o “talvez” não os afastava, contudo, iam alimentando o que tinham sem sequer mencionar o futuro. Somente pele, vontade e uma pitada de malícia.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011



Que seja cumplicidade, porque a vida já é difícil sem afetos. o som dos passos no corredor pode ser um conforto inacreditável, o corpo ao lado na cama uma âncora para a alma aflita.


Lya Luft

sábado, 19 de novembro de 2011

“Não se trata de incapacidade de sentir a coisa, sou um ser humano plenamente funcional. Mas, sabe aquela do Stevie Wonder, “I Just Called To Say I Love You”? Pois é, não está na minha lista.”

”Se me perco no teu beijo, você fica tentando encontrar um caminho. Quando me encho de receio, você me diz estar pronta. Eu te ponho em xeque-mate, você me diz que cansou de jogar. Quando não quero me machucar, você me telefona no meio da noite.”
Gabito Nunes
Estou te ligando movido pela vontade de reaver você e aquilo que tínhamos até semana passada. Eu penso em você dia e noite e fico ridiculamente abalado se a gente acaba brigando. Eu acho que te amo, garota.”
Gabito Nunes

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Uma dor chamada saudade

Entre um capitulo e outro da minha história, encontro versos inacabados e entre os versos uma saudade…
Hoje meu dia começou assim: Com uma dor aguda por dentro. É que de vez em quando o meu coração dói.  Dói uma dor inteira. Dói porque a mão da saudade atravessa o meu corpo, toca o meu coração e o aperta. E aperta firme, daquele jeito que só resta gritar até a dor incômoda passar. E eu gritei! Gritei alto, bem alto, para que a saudade – por caridade – trouxesse a superfície da memória, lembranças daquele tempo em que passávamos horas e horas falando sobre sentimentos e a vasta alegria de tê-los dançando do lado de dentro. Eu gostava de ser feliz e ela também. Tínhamos vocação congênita para a felicidade, muito embora as tristezas viessem nos visitar de tempos em tempos, deixando apenas uns poucos retalhos de alguns sentimentos. Mas éramos felizes e com fios de felicidade costurávamos novamente a nossa história. Vivíamos assim, entre inconstantes recomeços; mas sem perder a alma para o desânimo que vinha junto com a tristeza. No fundo, no fundo, tínhamos como sobrenome a coragem. Talvez fosse esse o motivo das nossas almas terem se encontrado quando ainda estavam perdidas. E estavam mesmo… A origem disso tudo eu não me recordo. Lembro apenas de uma história de amor mal sucedida, que enlouqueceu os seus sentimentos, e a fez perder o prumo. E eu estava lá, bem perto, tentando dizer o indizível, mas não conseguia porque ela me faltava.
Que saudade… Saudade de um tempo que não volta, mas parece que ainda não foi. E enquanto a dor incômoda ardia no meu peito, lembrava-me dos nossos dias de sol e das noites sob as estrelas; de tudo aquilo que ela guardava em segredo, mas gostava de dizer.  Ela inventava histórias felizes e eu as imaginava. Vivíamos emoções infinitas contando histórias bem sucedidas, escritas em versos de amor. Dançávamos ao som da música da vida tendo como tom a generosidade. Trilhávamos juntas o caminho das certezas, até quando elas não existiam. Um dia ela resolveu me contar seus segredos, e eu lhe dizia as  minhas verdades ocultas; e das nossas confidências surgiam sonetos de esperança. Esperança grandiosa, plantada dentro do coração, que faz a gente acreditar até o último instante, mesmo quando a vida resolve emitir sons de espanto. Víviamos felizes porque tínhamos esperança! Talvez por isso eu sinta tanta saudade dela: Porque tudo nela alcança a vida.
Logo me dei conta de que algumas horas haviam se passado e eu ainda estava ali, com a viva lembrança nela. Lembrando com ternura até esquecer-me da dor. Aquela dor que é desatino; que fere, mesmo sem tocar. A dor do que foi sem tempo certo para voltar. A dor imensa da ausência. Assim a falta dela dói em mim. E mesmo que eu tente explicar, não consigo dizer porque ela se foi e me deixou aqui, perdida entre um verso e outro. Quanta saudade eu sinto de você…
Você: A intraduzível palavra que habitava aqui, dentro de mim!

Iluminada.




Hoje amanheci sol. Sol que brilha intenso; que ilumina palavras e faz falar coração mudo. Amanheci sol por que ao abrir os meus olhos vi a sua imagem refletida ali, fora de mim… Vi você! Você que habitava dentro e percorria meus espaços de afeto, agora me olhava inteira, tentando descobrir o caminho impenetrável das minhas incertezas. Você que usou a ternura para mergulhar no meu inacessível e desvendar os meus íntimos segredos. Você, que ouço com devoção, o coração bater em suave melodia de amor. Você, finalmente estava aqui e trouxe de presente o intraduzível; o inexplicável, que coloriu até o inexpressivo que havia em mim. Eu, que estava quase sucumbindo, hoje vivo essencialmente em ti!

Conversando com Clarice.

Não, não…  Não sou leve a vida inteira. Às vezes eu tenho o peso da complexidade da vida dentro de mim. E é justamente por isso que, de vez em quando, me desentendo dos sentimentos todos.  E não pense que misturar sentimentos aqui dentro é loucura enunciada ou prelúdio de uma iminente insanidade. Não, não! Isso é vácuo, que me suga para dentro; que me faz silenciar e remexer até encontrar sentido. Eu mergulhei… Mergulhei no meu íntimo secreto, na tentativa de enxergar o sentido inalcançável da vida.  Ah Clarice! Você que enxerga os pormenores da alma humana, consegue me ver? Enxerga que eu sou pormenor agora? Sou fragmento; uma pequena partícula isolada no silêncio da alma. Sou uma parte dentro de todos os sentimentos misturados. Mas ainda sou. E não, não sei explicar quando e como isso acontece.  Não me conheço tanto ao ponto de esclarecer alguns impossíveis dentro de mim. Você consegue Clarice? Lembro quando você disse: “O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós”. Talvez eu seja um fragmento do amor impossível! Talvez eu seja a coragem de ser amor o tempo todo. Talvez! Eu ainda não sei, Clarice. As explicações fogem e eu não as alcanço, assim como não alcanço o conceito de ser. Ser é o quê? Ser é existir? Ser é sentir? Talvez eu sinta tudo com a expectativa do que é passível de acontecimento. Talvez eu seja a coragem dos sentimentos todos que carrego aqui dentro. E, ser a coragem dos sentimentos que acontecem de verdade, também é amor.
Aliás, Clarice, por falar em amor, digo sem vergonha alguma, que quando amo de verdade, também não sei explicar. . . É algo que eu não c0nsigo esclarecer. Eu sinto, apenas. Também não sei dizer esse amor. Não há palavra que alcance a tradução da imensa emoção de ter alguém aqui, guardado dentro de mim; percorrendo a essência da minha alma. O que acontece é a sensação. E, quando amo alguém de verdade, a vontade que eu tenho é de engolir a pessoa. Isso! É essa a sensação: Uma sensação traduzida pela vontade de engolir e guardar a pessoa dentro. Por quê?  Eu também não sei. Talvez para protegê-la, salvá-la. Talvez, quem sabe, para protegê-la e salvá-la de mim mesma. Porque quando eu amo, posso oferecer perigo! Às vezes sou brisa suave, outras vezes vento que sopra forte e derruba tudo. Não sei permanecer suave, vou logo entrando, me instalando, dizendo, absorvendo. Sou toda intensidade! Por isso eu te disse: Não, não sou leve a vida inteira…
Outra coisa interessante que descobri sobre o amor que me invade, é que o amor que eu sinto não é daqueles que vêm do fundo do coração; o amor que eu sinto é daqueles que vêm do fundo do útero. E, embora o coração o revele, quando bate descompassado, o útero é mais profundo porque é capaz de gerar vida. E amor é semente de vida que floresce! Amor nunca é quase vida.  Amor é vida que floresce! Isso eu já compreendi.  E eu amo assim, do fundo do meu útero! Seria essa uma explicação plausível para o amor e a complexidade da vida dentro de mim?
Talvez nada tenha tanta explicação e ouvir o silêncio da alma, quando se mergulha nela, é um meio de fazer tudo se explicar… E nessa tentativa de explicar e traduzir o intraduzível dentro de mim, eu escrevo. E escrever sobre aquilo que a gente não vê, mas sente, é tarefa árdua. Para muitos escrever é um dom; para mim é o bem que me salva – assim com salvou você, Clarice. E, sinceramente, não sei se há algum dom misturado a esse imenso desejo de salvação. Será que eu consigo entender tudo aquilo que existe? Você me disse que “escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada”. Escrever é, então, a minha única esperança, Clarice. Esperança e necessidade de preencher alguns dos meus infindáveis vazios existenciais.  E entender os vazios existências é uma das formas de se abençoar uma vida…
Depois de tanto lhe ouvir Clarice, descobri que escrevendo vou desconstruindo a minha complexidade interior e transformando a minha essência fragmentada em vida. Descobri que escrever é o bom senso que me dobra e me recupera de dores emocionais, mesmo após revelar minha incapacidade de traduzir alguns dos meus tantos sentimentos; como por exemplo, o amor…  Mas, ainda assim, após tantos questionamentos que sobrecarregam a minha essência, confesso que alguns eu já consigo decifrar. Decifrar e entender! E entendo, porque ao escrever o que sinto, me organizo inteira e volto a ser leve, feito “pétala que voa”.

O que me retém.

O que me retém não é o medo da vida. Não! Também não é o eterno desentendimento entre aquilo que recebo dela e aquilo que julgo ser justo receber. Nesse ponto haverá sempre um impasse, mas, ao final de cada ciclo, a gente acaba se entendendo… O que me retém mesmo é o meio do caminho que existe entre o seguir e o ficar. E o meio do caminho quase sempre é um passo curto rumo à casa da incerteza. E a incerteza é o que mais me retém.
O que me retém não é a exigência de um posicionamento seguro diante das circunstâncias. O que me retém é a escolha… É ter que escolher e vestir a personalidade certa para dar conta delas: Posso ser firme como uma rocha e não sair do lugar; ou ser leve como uma pluma, e ir aonde o vento da vida quiser me levar. Porque, algumas vezes, contrariando as circunstâncias todas, o vento da vida segue junto, na mesma direção, e nos leva aonde desejamos chegar. Outras tantas, o vento da vida sopra na direção contrária dos nossos desejos e aí, o conflito é o pouso certo… Nesse caso, o que me retém é o peso incalculável da dúvida.
Não! O que me retém não é a sensação de vazio. Porque vazio é nada; e o nada não absorve; não filtra; não preenche… E um coração que sente, não permanece inabitado por muito tempo – e pulsa intenso, até na inexistência. O que me retém é a ausência atrás da porta, quando enfim encontro a tão desejada saída, após ter me perdido dentro de um imenso labirinto emocional. Porque no fundo, no fundo, o que todo mundo quer após se perder, é encontrar nos braços abertos de alguém a paz que conforta.
No meio de tudo o que existe, mas foge ao meu alcance; no meio de tudo o que vejo, mas não enxergo com clareza; no meio de tudo o que sinto, mas não consigo traduzir, há sempre alguma coisa capaz de me reter.  E me retém. Mas, no meio dessas coisas todas – que eu encontro dentro e fora de mim, aquilo que me retém de fato, é a pouca intensidade da força interior que disponho no momento certo avançar.

"As palavras me antecedem e ultrapassam,
elas me tentam e me modificam, e se não tomo cuidado será tarde demais: as coisas serão ditas sem eu as ter dito."


(Clarice Lispector)
Tem dias que eu não enxergo consequências e pretendo muito mais do que os meus braços alcançam. Tem dias que eu não tenho fé. E preciso me condicionar a alguma coisa, só para poder firmar os pés no chão. E acordo, sorrio e percorro o caminho dos sentimentos, por pura teimosia.



terça-feira, 1 de novembro de 2011

‎"Pouquíssima gente me desvenda. Mostro só o que quero. Não por maldade, mas por proteção. A gente tem que aprender a se proteger. Das escolhas dos outros. E até mesmo das nossas próprias escolhas."

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Derramei três lágrimas: a primeira escorreu pela face e perdeu-se na boca, a segunda morreu achatada contra o assoalho, a terceira caiu na tua mão. E foi a que mais doeu. - Caio F Abreu

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Eu acho que um dos maiores charmes de um encontro de amor é a admiração que cada um sente pelo jeito inexato como o outro  é, mas capaz de fazer florir deleites na alma com rara exatidão.

domingo, 23 de outubro de 2011


Ele vive por aí. Com aquele meio sorriso de punhal. Com aquelas mãos que nasceram para acariciar cinturas finas. Com aquele ar de quem não faz questão nenhuma. Vive por aí com suas respostas prontas. Com saídas estratégicas. Com promessas criadas apenas para compor seus anseios. Com seu cabelo bagunçado de propósito. Com seu coração duro de propósito. Com a camiseta mais perfumada. Vive por aí com seus drinks e suas cantadas ensaiadas. Com suas voltas e nenhuma parada. Com suas desistências e ironias marcantes. Com seus beijos despreocupados. Com sua carne sensual desprotegida. Ele vive por aí. Com seus interesses que não beneficiam ninguém. Inteiro. Intrigante. Impossível.
Camila Heloíse

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Cansada de sentir felicidade em doses homeopáticas. Entrega-se a tantos beijos tentando encontrar a porta certa, de entrar em algum lugar e ficar pra sempre. Guardando o seu melhor para o melhor momento, mal sabe ela que este momento já passou por debaixo do seu nariz tantas vezes, e que, de tanto se guardar, protegeu-se de histórias de amor que pudessem ter dado qualquer sentido à vida. Traz no peito uma semente de girassol que não vingou. Abafou com tantos medos as verdades doces, distribuindo no lugar sorrisos amarelos e tementes. Foi tragada pelo tempo, pela descrença nos contos, pela falta de fé que as coisas podiam continuar, sem cobrar tanto entendimento do coração. Foi engolida pelo calor da espera, cremada por expectativas vãs. Perdeu-se no silêncio até deixar seu riso mudo, até deixar a esperança calada, até formigar o corpo pela falta de movimento, até se acostumar com a insônia.
E só queria pertencer.



Ai de mim que me perdi em amores tantos que fiquei tonta. Vivendo alegrias descontinuadas, mal acabadas, alegrias temporárias que arrastei como arrastam-se os dias.
Fiquei assim, um dia macia dentro do abraço do moço que jurou ficar, ficar fora de mim e das minhas vistas míopes. Antes macia, virei pedra de tanto gastar a maciez na vaga lembrança do sabor daquele beijo.
Me perdi de tanto velejar pelos tempos, indo de um lado pro outro sem nunca voltar pra casa, sem nunca ter um lar pra ficar, ficar e deixar meu cheiro. Carreguei tantas mochilas que me desconheço em peso. Não sei se tenho alguns tantos quilos, toneladas ou quilômetros.
Fui tão feliz que o riso enlarguesceu, frouxo agora, caído, já não sabe se abrir com as manhãs. Me perdi, disso eu sei, disso eu só sei.
Farta de tanta gente que passa por mim como se eu fosse uma avenida, destas que se passa com tanta pressa pra não causar engavetamento. Me tocam como corrimão, correm, é tudo tão de pressa que não deixa digitais.
Cansada de não dar tempo de olhar nos olhos pra descobrir se é a hora de ficar e me fazer feliz. Exausta de me repetir milhões de vezes que mereço algo bom pra sempre e o coração sentir o contrário. Quero pertencer às contas que somam e nunca terminam, e poder ficar, em dias de sol ou de temporal.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011




ELE anda cansado das baladas e dos casos furtivos sem sentimentos. Aprendeu a gostar da própria companhia, sem precisar estar em uma turma de amigos todos os sábados. Decidiu que quer um amor verdadeiro… que pode nem ser eterno, mas que traga um sabor doce às suas manhãs, que seja a melhor companhia para olhar a lua. Que ele possa exibir os seus dons na cozinha e o seu conhecimento em vinhos, só para ela.
Quer uma mulher que ele reconheça pelo cheiro dos cabelos, pelo toque dos dedos, pela gargalhada que vai ecoar pela casa transformando um domingo sem graça, no melhor dia da semana. Quer viver uma paixão tranqüila e turbulenta de desejos… quer ter para quem voltar depois de estar com os amigos, sem precisar ficar “caçando” companhias vazias e encontros efêmeros. Quer deitar no tapete da sala e ficar observando enquanto ela, de short jeans, camiseta e um rabo de cavalo, lê um livro no sofá, quer deitar na cama desejando que ela saia do banho com uma lingerie de tirar o fôlego.
Quer brincar de guerra de travesseiros, até que o perdedor vá até a cozinha pegar água. Quer o poder que nenhum dos seus super heróis da infância tiveram… o poder de amar sem medo, sem perigo e sem ir embora no dia seguinte.
Quer provar que pode fazer essa mulher feliz!
ELA quase deixou de acreditar que seria possível ter vontade de se envolver novamente. Foram tantas dores, finais, recomeços e frustrações que pensou em seguir sozinha para não mais se machucar. Então percebeu que a vida de solteira já não está fazendo tanto sentido. Decidiu que quer um amor verdadeiro… que pode nem ser eterno, mas que possa acordá-la com um abraço que fará o seu dia feliz, quer um homem que ela possa cuidar e amar sem receios de que está sendo enganada. Quer a alegria dos finais de semana juntinhos, as expectativas dos planos construídos, o grito de “gol” estremecendo a casa quando o time dele estiver ganhando… a cumplicidade em dividir os segredos.
Quer observá-lo sem camisa, lendo o jornal na varanda… quer reclamar da bagunça no banheiro, rindo e gritando quando ele revidar puxando-a para o chuveiro, completamente vestida.
Quer a certeza de abrir a porta de casa e saber que mesmo ele não estando, chegará a qualquer momento trazendo o brigadeiro da doceria que ela gosta tanto. Quer beijar, cheirar, morder, beliscar e apertar para ter certeza que a felicidade está ali mesmo… materializada nele.
Quer provar que pode fazer esse homem feliz!
ELES estão por aí… sonhando um com o outro… talvez ainda nem se conheçam… mas é só uma questão de tempo, até o destino unir essas vidas que se complementam e estão ávidas para amar e fazer o outro feliz.
Ou alguém duvida que o universo traz aquilo que desejamos?

Meu olhar não diz muito aos distraídos, diria eu que praticamente nada. Mas para os bons leitores de alma, ele é praticamente uma bula.

— Tati Bernardi


O que você tem, todo mundo pode ter. Mas o que você é, ninguém pode ser.
— Clarice Lispector

É o jeito, o cheiro, o modo de vestir, como caminha, como olha, como para. Não sei. Eu amo.

— Gabito Nunes

Não procure alguém que te complete. Complete a si mesmo e procure alguém que te transborde.

(Clarice Lispector)


Assustada com o amor? Ah, não. Tanta gente querendo, tanta gente sentindo falta. E você de repente abençoada - e confusa? Fica não.
— Caio Fernando Abreu

terça-feira, 18 de outubro de 2011

"Sinto dentro de mim uma explosão. De tudo, principalmente de emoções. Elas chegam impiedosas, feito rajada forte de vento. Quase me derrubam, tento me segurar. Na verdade, tento segurar tudo porque quero tudo pra mim."
Posso de vez em quando ser ranzinza. Mas ainda prefiro ser desse jeito do que me vender de uma forma bonita, pra todo mundo acreditar no que a imagem diz. Muita gente é assim: aos quatro ventos, diz uma coisa. Lá no fundo, é outra. Eu não sei me vender, só me dar. E essa, pra mim, é a melhor prova de que eu ainda (não) sei viver.
Eu não busco uma pessoa que está nos livros, quero alguém real. Mas o que eu quero, de verdade, é que o 


alguém real aceite a minha realidade. E ela é essa, se apresenta desse jeito. E não tem intervalos porque o meu 


coração nunca para.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

"Me cerco de boas intenções, me reservo pros poucos e melhores amigos. Me encho de luz. Me permito o riso."

Que a cada manhã a sua coragem acorde bem juntinho de você, sorria pra você, e o convide para viverem uma história toda nova, apesar do cenário aparentemente costumeiro. Que tenha saúde no corpo, saúde na alma, saúde à beça.”

– Ana Jácomo

domingo, 16 de outubro de 2011





Uns demoram a vida toda pra descobrir, outros jamais descobrem.
Descobri à mim mesma, colidi com meu eu.
Fiz-me incompreensível aos outros, isolei-me de própria vontade.
Só não quero deixar me amargar, fazer da consciência um eterno desconforto.
Basta me encontrar para me perder, basta pensar para sofrer.
Só então entendo os felizes: não pensam.
Minha vida é pensada, e tenho tanto, 
que jamais abandonaria meu pensamento.
De tanto, me tornei pouco: pouco feliz, pouco apaixonada, pouco alienada.
Tão raros são aqueles que me persuadem, tão breves, tão escassos.
Não preciso de muito. 
Preciso de um único, um inteiro.
Preciso de certa absolutez para que de algo possa me sentir completa.
Mas o que de fato no presente momento mais necessito é de mim mesma.
Para que haja possibilidade de próprio querer, de próprio fazer.
Há vida, há medo, há ânsia.
Não nego, jamais.

sábado, 15 de outubro de 2011




Se existem verdades absolutas neste mundo, uma delas é que todos nós temos medo de sofrer. Assim, ingenuamente tentamos controlar as situações ao nosso redor, como se isso fosse possível...

Obcecados por esse desejo de nos proteger, gastamos nossa energia e nosso tempo tentando controlar os pensamentos, as atitudes e até os sentimentos das pessoas que amamos e que, sobretudo, desejamos que nos amem.

No entanto, não nos damos conta de que a vida se baseia no imprevisível, no incontrolável, no surpreendente! Nenhum sentimento é garantido, nenhuma consequência é revelada antecipadamente. O futuro é totalmente incerto. E apesar de tamanha imprevisibilidade, temos em nosso coração toda a possibilidade de conquistarmos o que e quem amamos, o que é muito diferente de controlar, prever ou obter garantias!

Muitas pessoas não conseguem encontrar um amor, não se entregam a uma relação profunda e verdadeira simplesmente porque estão, todo tempo, tentando obter certezas. As perguntas não param de gritar, as dúvidas não têm fim e o medo de se deparar com a dor parece assombrar milhares de corações, impedindo-os de enxergar uma outra possibilidade, tão plausível quanto a de sofrer.

Será que ele me ama? Será que vale a pena perdoar e tentar de novo? Será que ele não vai me trair? Será que não estou sendo idiota? Será que não vou sofrer mais do que se ficar sozinho? Será? Será?...

O que será, eu responderia com muita tranquilidade, não importa agora! Na verdade, nunca importará! A pergunta correta é: “Eu quero?” Quando aprendermos a responder, com respeito e responsabilidade, essa simples perguntinha, teremos previsto qualquer possibilidade.

Sim, porque o amor é uma chance, uma oportunidade; não uma garantia; nunca uma certeza! Podemos vivê-lo conforme nossa vontade, de acordo com nosso coração ou... passaremos a vida inteira tentando controlar o incontrolável, garantir o incerto!

Jamais teremos como saber se o outro está sendo fiel, se o amor que sentimos é correspondido na mesma medida, se vamos sofrer ou seremos felizes. Jamais saberemos do amanhã ou do outro.

Então, que usemos nossa inteligência, a despeito de todo o medo que isso possa nos fazer sentir. Ou seja, que possamos, de uma vez por todas, abrir mão dessa tentativa inútil de controlar o amor, a vida e o outro e nos concentremos em nós, em nosso coração e em nossos reais objetivos!

Descobriremos que nos ocupar com nossos próprios sentimentos já é trabalho para vida inteira. Descobriremos que agir conforme nossa vontade é o bastante para que nos sintamos preenchidos, embora possamos mesmo vir a sofrer... simplesmente porque o sofrimento é uma possibilidade tão possível quanto a felicidade!

E digo mais: só conseguiremos entrar de fato no coração de alguém, mesmo sem termos certeza disso, quando tivermos a audácia e a coragem de nos entregar ao imprevisível; quando conseguirmos compreender que a segurança é mérito pessoal, interno, sentimento que não se pode ter em relação a ninguém além de nós mesmos.

Portanto, para todas as pessoas que têm me perguntado sobre qual é o “segredo” para viver o amor sem sentir tanta insegurança, tanto ciúme e tanto medo de sofrer, aproveito este momento para responder: o segredo está em saber se você quer, se você realmente quer! Porque se você quiser e fizer por merecer, agindo você com sinceridade, qualquer possibilidade de dor e sofrimento valerá a pena. Porque quando a gente quer de verdade, com o coração, a magia do amor nos faz entender que sofrer faz parte do caminho e, no final das contas, é tudo crescimento, aprendizagem, evolução e, por fim, a tão desejada felicidade.

E não que ela esteja no final do caminho ou no final da vida, simplesmente porque ser feliz é isso: entregar-se ao imprevisível e aceitar a dor e a alegria como partes do amor! E quando penso que essa entrega é realmente difícil, me lembro de uma frase que gosto muito:
"Se o seu problema tem solução, relaxe... ele tem solução.
E se o seu problema não tem solução, relaxe... ele não tem solução!"
É uma frase engraçada, mas muitíssimo sábia. Portanto, quando estiver doendo muito, não resista! 

Simplesmente relaxe e aceite, pois a resposta virá!

Delivery




Quando paramos em frente ao flat, lembro que ainda perguntei mais uma vez se era isso mesmo o que ela queria. Ela apenas me olhou e sorriu triste. Como quando a pessoa está cansada de saber da dor do dia seguinte mas insiste em congelar um dia. E saiu do carro com delicadeza e uma esperança infantil de eternizar segundos.

Olhei ela entrando, de longe. Aquilo foi terrível. Queria sair gritando e agarrá-la pelo pescoço. E dizer mais uma vez que ela não precisava disso. E que uma hora tudo iria ser tão lindo e saudável e preenchedor. Mas a deixei ir, como uma mãe que sabe que o filho vai sofrer mas acha inevitável abrir as pernas para libertá-lo.

Três coisas facilitaram que ela achasse a vida muito divertida: o óculos escuro vagabundo que ela ganhou no casamento, as havaianas pra quando o pé cansasse e o fato de que a noite ia começar quando o dia já estava para nascer.

No elevador ela se achou absolutamente linda. Coisa que só achava nessas situações em que ninguém poderia saber o que ela estava fazendo. Ela se transformava em personagem para enganar a vida chata e todas as suas imperfeições. Tive dó quando vi a alegria que ela sentiu ao ver aquele corredor com dezenas de números. Era como uma gincana inocente onde só uma porta tinha o bilhete premiado e ela era a única que sabia o número.

Depois esperei, do lado de fora. Tudo virar frio. Ela se cansar do frio. Ela procurar o controle remoto do ar condicionado e não encontrar e morrer de frio. E querer um pedaço da coberta mas não ter mais permissão para querer. E querer um abraço mas não ser mais permitido ganhar isso. E querer pedir ajuda em relação ao frio mas não ser mais permitido pedir ajuda. E querer ser vista mas não ser mais permitido existir.

Esperei ela finalmente cansar do frio e se levantar sem fazer barulho. E enfrentar o dia seguinte, com tudo o que ele tem de real. A realidade cheia de pontas cortantes. A realidade que transforma uma mulher cheia de sonhos e carinhos e algumas boas frases em mais uma pizza que esfriou. Um delivery vencido.

E esperei sofrendo o momento em que ela se olharia no espelho e diria com os olhos borrados que sua ficha caiu. E esperei ela resgatar pelos cantos não íntimos, em silêncio e sem cúmplice, tudo o que era seu com medo de deixar algum rastro ou parecer boba.

Esperei sentadinha do lado de fora, com o coração na mão. Com medo dela fazer alguma besteira como beija-lo quatorze vezes mesmo ele sendo mais um desses caras que não vão sequer até a porta pra se despedir ou ligam para saber se o táxi chegou direito.

Ainda assim, ela é uma dessas garotas que beijam mais um desses caras quatorze vezes. Porque um desses caras, que dá vontade de beijar quatorze vezes, aparece a cada quatorze caras. E ela se despediu de uma felicidade e uma gentileza que existiram apenas na sua emoção. O que já era algo nessa vida chata cheia de gente chata. Alguém que despertava a sua emoção.

E ela finalmente saiu. Ela e seu sorriso triste novamente. Agora um pouco mais triste mas ainda assim iluminado. Ela e sua vontade de tomar banho quente e comer pão de queijo e voltar a ser apenas uma menina que sonha com alguém para se fazer isso junto, pela manhã. Com a maquiagem borrada e o vestido de ontem. E medo de ser confundida com puta na recepção do flat. E com medo dela própria, mais tarde, se confundir com puta.

Ela e seus óculos de brinquedo para esconder de brinquedo uma emoção de brinquedo. Usando sua havaianas para uma alma cansada. Achando graça que o dia terminava justamente porque começava de novo.

No Ibirapuera as pessoas corriam numa maratona. Cheias de certeza. Ela olhou tudo aquilo com um sono profundo. Enquanto alguns corriam, ela só queria parar. Parar em algum braço, em algum abraço. Parar finalmente. E tomar o banho quente e comer pão de queijo. E ter abraços permitidos para sempre. E poder reclamar do frio para sempre. Ela só queria se sentir quente, ainda que fosse de despedida.

Ela sabia que era amor de um dia e tinha topado, mas não aceitava que o amor de um dia tivesse acabado sem amor. Foi então que eu perguntei de novo, se era isso mesmo o que ela queria. E ela respondeu que não, não era. Mas na vida só existia uma coisa mais forte do que querer: a própria vida. Ela adormeceu no táxi, cansada o suficiente pra não se sentir suja e boba o suficiente pra engolir a saliva feliz, como se ainda pudesse reviver algo que havia morrido tão rápido.

Achei aquilo lindo, achei que aquilo era a vida. E acabei dando finalmente o abraço eterno que ela tanto queria e que eu tanto queria. Ainda que se perdoar não melhore a solidão de ninguém.



"Seduzir não é dar respostas, mas tirar as respostas do outro."

sexta-feira, 14 de outubro de 2011




Ela deixou que a mão dele descesse até abaixo da cintura dela. E numa batida mais forte da percussão, num rodopio, girando juntos, ela pediu:
— Deixa eu cuidar de você.
Ele disse:
— Deixo.





- Caio F Abreu

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Todo o resto

"Existe o certo, o errado e todo o resto". Esta é uma frase dita pelo ator Daniel Oliveira vivendo Cazuza, em conversa com o pai, numa cena que, a meu ver, resume o espírito do filme dirigido por Sandra Werneck e Walter Carvalho. Aliás, resume a vida.
Certo e errado são convenções que se confirmam com meia dúzia de atitudes. Certo é ser gentil, respeitar os mais velhos, seguir uma dieta balanceada, dormir oito horas por dia, lembrar-se dos aniversários, trabalhar, estudar, casar-se e ter filhos, certo é morrer bem velho e com o dever cumprido. Errado é dar calote, rodar de ano, beber demais, fumar, se drogar, não programar um futuro decente, dar saltos sem rede. Todo mundo de acordo?
Todo mundo teoricamente de acordo, porém a vida não é feita de teorias. E o resto? E tudo aquilo que a gente mal consegue verbalizar, de tão intenso? Desejos, impulsos, fantasias, emoções. Ora, meia dúzia de normas preestabelecidas não dão conta do recado. Impossível enquadrar o que lateja, o que arde, o que grita dentro de nós.
Somos maduros e ao mesmo tempo infantis, por trás do nosso autocontrole há um desespero infernal. Possuímos uma criatividade insuspeita: inventamos músicas, amores e problemas, e somos curiosos, queremos espiar pelo buraco da fechadura do mundo para descobrir o que não nos contaram. Todo o resto.
O amor é certo, o ódio é errado e o resto é uma montanha de outros sentimentos, uma solidão gigantesca, muita confusão, desassossego, saudades cortantes, necessidade de afeto e urgências sexuais que não se adaptam às regras do bom comportamento. Há bilhetes guardados no fundo das gavetas que contariam outra versão da nossa história, caso viessem a público.
Todo o resto é o que nos assombra: as escolhas não feitas, os beijos não dados, as decisões não tomadas, os mandamentos a que não obedecemos, ou a que obedecemos bem demais - a troco de que fomos tão bonzinhos?
Há o certo, o errado e aquilo que nos dá medo, que nos atrai, que nos sufoca, que nos entorpece. O certo é ser magro, bonito, rico e educado, o errado é ser gordo, feio, pobre e analfabeto, e o resto nada tem a ver com estes reducionismos: é nossa fome por idéias novas, é nosso rosto que se transforma com o tempo, são nossas cicatrizes de estimação, nossos erros e desilusões.
Todo o resto é muito mais vasto. É nossa porra-louquice, nossa ausência de certezas, nossos silêncios inquisidores, a pureza e a inocência que se mantêm vivas dentro de nós mas que ninguém percebe, só porque crescemos. A maturidade é um álibi frágil. Seguimos com uma alma de criança que finge saber direitinho tudo o que deve ser feito, mas que no fundo entende muito pouco sobre as engrenagens do mundo. Todo o resto é tudo que ninguém aplaude e ninguém vaia, porque ninguém vê.
Coisa rara e bonita é a gente poder se comunicar por meio da alma, sem que palavra alguma necessariamente aconteça.
Ana Jácomo
"Quisera descansar meu peito como se houvesse outra vida em mim. Saber-me dona do meu tempo, repousada e calma na inspiração. Quisera encontrar abrigo numa paz maciça de esquecimentos. E que o dia não terminasse abrupto na eternidade do melhor momento. Mas há que se dizer de fases em que algumas frases vêm anoitecidas. E a força foge ao controle e a tristeza invade um bocado da vida.E o choro não resolve nada, nem nos desvencilha desse mar de dor. Se o peito de engasgado cala, quem será a voz a me falar de amor? Mas há que se dizer também que nunca uma frase dói a fase inteira. Palavra também amanhece e o pensamento tem que acordar junto. Por isso que o choro seca, que ao amor há entrega porque finda o luto. Descubro que em tempos de guerra o peito se cala, mas na poesia nunca fica mudo."

Marla de Queiroz. 

segunda-feira, 10 de outubro de 2011


É fato que fomos. Mas seria muito esquisito me despedir de você cumprindo todos os pré-requisitos dos dramas clássicos. Prefiro acreditar que você foi uma chuva precipitada que eu só tive coragem de experimentar por detrás da vidraça. Assim, como já fizemos tantas vezes com outras pessoas.Também queria te dizer que só vou me entregar à outra narrativa quando ela se tornar uma história coesa, coerente, bem elaborada. Renuncio desde agora às relações em que todos os passos levam apenas a um contato irremediavelmente externo com a palavra.Eu gosto mesmo é de misturar agudezas com tons graves. Bem se vê na escala cromática dos meus sentimentos.Meus amarelos tão vivos, primitivos.Meus vermelhos tão trêmulos. Minhas cores acesas, em brasa.Mas, no meio disso tudo, quero te contar que ando tão emendada em eventos sociais que sinto saudade da minha solidão. Ela tem o aspecto positivo de não me deixar me perder de vista. Eu preciso me olhar bem por dentro, de tempos em tempos, por um bocado de dias pra que eu continue merecendo minha poesia.É diferente da solidão que se sente quando se está acompanhado: neste caso, perdemos de vista o outro.
E tenho estado muito feliz, antes que você pergunte. Tenho mania de adiantar momentos incríveis com a força do meu pensamento, você sabe. Depois eles se materializam e eu os celebro.
Então, janeiro foi embora sem se despedir...FERVEreiro no Rio,e ontem foi dia de Iemanjá. Pensei em jogar palmas no mar como tantos, mas não tive coragem, ele estava engasgado com tanto lixo: herança de um domingo de sol.Deu até aperto no peito.Nenhuma onda e o mar calmamente imundo.
Nem era sobre isso que eu ia falar.Mas esses assuntos que mudam de rumo repentinamente se parecem muito com nós dois: desejo e poluição.
E a impossibilidade de mergulhos.



(É fato o que fomos.)


*


*


Marla de Queiroz

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Nossos medos.





Fiquei surpresa com a sua revelação. Fez bem para o meu ego, não nego, mas me surpreendi. Fazia tempo que não falava com você sobre as coisas da vida, passado, presente, futuro. Conversávamos tanto antigamente. Hoje em dia somos dois desconhecidos que um dia tiveram alguma coisa. Acima de tudo, sempre gostei de falar para você da minha dificuldade de compreender o mundo como ele é. Nós dois sabemos que espero demais das pessoas. Por que será que sou assim? Hoje você disse uma coisa que achei bonita: "você espera demais dos outros porque tem um coração puro, que de tão puro sofre". É, eu sofro.

Às vezes lembro de um trecho do Caio Fernando Abreu, no livro de Cartas, que diz mais ou menos assim: os escritores são as criaturas mais estranhas do mundo, não sabem viver o real, procuram sempre um drama, algo para sofrer e depois sentam e escrevem belos textos literários. Eu sempre fui dramática, desde pequeninha a veia Maria do Bairro me acompanha. Meus dramas são intensos, minhas paixões são intensas, minhas alegrias são imensas. Não sou nada racional, vivo de acordo com o que meu coração diz, com o que meu sentimento grita. Pago caro, mas sei que tudo tem seu preço.

Gostei de saber que você perdeu o medo. Eu também perdi, demorou, mas perdi. Nós tínhamos em comum o medo da entrega. Por isso, nos distraíamos com amores passageiros. No final das contas o vazio nos atingia. Juntos, descobrimos que o medo sempre precisa ser vencido. Separados, vencemos nossos temores, cada um da sua forma, no seu tempo. Acho que a vida coloca pessoas nas nossas vidas por alguns motivos. Com você, aprendi que tudo precisa ter limite.

Acho graça quando você fala aquelas coisas. Você me vê de um jeito que não consigo entender. Me acha mais bonita do que realmente sou. Me acha mais inteligente do que sou. Me acha mais forte do que sou. Me acha mais incrível do que sou. Desculpa, não quero te decepcionar, mas não sou tudo isso. Sei que você conhece meus defeitos, minhas falhas. Mas não entendo como essas coisas não te abandonaram com o passar dos anos. Fico rindo quando você fala que tenho cara de boneca, que meu nariz é perfeito, que minha boca é perfeita, que meus olhos são perfeitos, que meu rosto é todo belo. Não acho tudo isso, falo sério. Não sou essa belezura toda, não sei da onde você tira essas ideias malucas. E, pelo amor de Deus, não sei de tudo, eu tenho minhas limitações, não sou essa inteligência e esperteza toda. Eu conto nos dedos e uso calculadora. Não sei onde fica a Guiana Francesa. Não entendo nada de política. Sempre me embanano no horário de verão, nunca sei se adianto ou atraso o relógio. Também fico pensando "ih, agora nem são 22:31, são 21:31", penso com o horário antigo. Não sou forte o tempo inteiro e não gosto de admitir isso, então não espalha. Eu sou fraca às vezes. Muitas vezes. Sou frágil e estou frágil agora. Tenho passado momentos não tão incríveis, não tão legais. Sei que vou superar, mas nem sempre acho força, então me fecho. Não quero ajuda de ninguém, sou uma filha da puta orgulhosa que não sabe pedir colo, quero que adivinhem. E eu preciso muito agora de alguma ajuda, uma mão na cabeça, alguém que esteja ao meu lado. Luto contra um ego chato, que muitas vezes me passa a perna. Tem dias que me acho o máximo, em outros me acho um lixo. Mas sei que mulheres são assim.

Estou numa fase de descobertas e de alguma fraqueza. Tenho sido muito dura comigo mesma, preciso relaxar um pouco. Tenho esperado demais dos outros. Tenho sentido falta de amor, de atenção. E é engraçado, tenho recebido tantas cantadas na rua. Sabe aquelas fases em que você está meio pra baixo e parece que o mundo te vê lá em cima? Recebo cantada na rua, mas você sabe que sou braba e faço gestos obscenos. Dia desses, fui pedida em casamento (de novo!) por e-mail. Me divirto com isso. Do nada, pessoas que já passaram pela minha vida ressurgem querendo retomar coisas que nunca vão voltar. Tem também as pessoas sem noção que convidam para sair ou os mais diretos que já vão direto ao ponto e falam coisas que tenho até vergonha de contar. E teve você, que me fez essa revelação hoje.

Te agradeço, de coração. Achei bonito mesmo. Sei que tudo vai ficar bem, sempre fica. Na minha vida as coisas sempre ficam bem. É que antes de ficarem bem eu fico vagando pela rua. Meu coração fica perdido num beco escuro, vazio, sem ninguém. É assim que me sinto com essa maldita síndrome do pânico. Não tem coisa mais chata do que isso. Eu gostava tanto de ser eu. Agora, vivo com medo. Me sinto tão pequena. Pior do que isso: me sinto tão sozinha. Sabe quando você carrega umas coisas nas costas e não tem ninguém para dividir o peso? Me sinto assim. Tem minha mãe, sempre ela. Fica do lado, ajuda. Mas ela tem a vida dela. Fico pensando: e quando ela for embora? Porque ela vai se mudar, vai ser eu e eu. Mas você tem razão, eu vou superar. Obrigada. Foi bom te encontrar de novo. Muita sorte nessa vida nova e que você nunca mais tenha medo. Torce para que eu nunca mais tenha também.